É proibido comparar (não aqui)

No meu vídeo sobre o Krystian Zimerman, alguém comentou algo muito muito muito significativo do preconceito moderno (vou ocultar o mensageiro, pois só a mensagem importa):

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Não acho que faça muito sentido comparar dois pianistas como Vladimir Horowitz e Krystian Zimerman, que atingiram a excelência. O mesmo penso quando querem comparar Bach com Beethoven. Não se deve fazer comparações, cada um com sua genialidade, trazendo novas formas de imaginação através das interpretações ou composições. São complementos, não comparáveis.

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Que coisa mais linda!

Maravilhoso!

A democracia entre aspas é mesmo um pitéu!

Está proibido comparar, pois somos todos seres superiores e supimpas e modernos e portanto reconhecemos a genialidade de cada um.

Ok!

Mas peraí…

A genialidade de “cada um”?!?!?!!!

Como eu sei que é a genialidade de cada um se não comparo uma com a outra?

Por que então não é a MESMA genialidade…

Mas sim uma OUTRA?

Essa diferenciação, veja bem, só é possível fazer a partir de uma comparação.

Bem, bem, bem…

Isso é muito primário, muito óbvio…

Nosso maravilhoso exemplar democrático não cairia numa coisa tão banal.

Então ele respondeu de volta:

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Comparar e reconhecer a genialidade única de cada um são coisas diferentes. Comparar pressupõe estabelecer parâmetros de superioridade ou inferioridade, enquanto reconhecer a genialidade de cada um é apenas valorizar suas contribuições distintas. Você pode diferenciar um diamante de uma esmeralda sem precisar decidir qual é ‘melhor’. A necessidade de comparação surge quando há um critério objetivo para julgar, mas na arte, a grandeza se manifesta de formas incomparáveis.

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Mais um pitéu!

Dá vontade de colocar num quadro e ficar admirando!

“– Olha como somos plácidos e maduros!”

Só que:

Comparar não pressupõe estabelecer parâmetros de superioridade ou inferioridade. Comparar é o ato de descrever as características de um à luz das características de outro. Sim, é verdade, depois de uma comparação, alguém pode preferir este ou aquele artista por este ou aquele motivo, mas pode muito bem haver um reconhecimento de grandeza equivalente, mesmo com características diferentes.

Sim, características diferentes podem ser igualmente grandiosas, mas só são “diferentes” porque se comparou.

Então vamos encurtar a história de hoje:

É impossível não comparar.

Mesmo quem diz como o cidadão aí, que não se pode comparar, está sempre comparando.

E não há vida humana, vida acadêmica, vida musical, vida profissional, enfim, não há vida sem comparação.

Então aqui vamos continuar comparando.

E, sim, as comparações vão continuar misturadas com opiniões pessoais.

Misturadas com ironia…

Misturadas com altos e baixos…

Misturadas com análise mal feita e com análise bem feita.

Misturadas com mudança de opinião e com causos pessoais.

Pois isso é uma coisa absolutamente normal e saudável.

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